segunda-feira, 25 de outubro de 2010

Anarquismo – o inimigo do rei e do Estado ainda vive






Há uma grande confusão em torno da palavra anarquismo. Muitas vezes a anarquia é considerada como um equivalente do caos e o anarquista é tido na melhor das hipóteses como um niilista, um homem que abandonou todos os princípios e, às vezes, até confundido com um terrorista inconseqüente. Muitos anarquistas foram homens com princípios desenvolvidos; uma restrita minoria realizou atos de violência que, em termos de destruição, nunca chegaram a competir com os líderes militares do passado ou com os cientistas nucleares de hoje.

A origem da palavra anarquismo envolve uma dupla raiz grega: archon, que significa governante, e o prefixo an, que indica sem. Portanto, anarquia significa estar ou viver sem governo. Por conseqüência, anarquismo é a doutrina que prega que o Estado é a fonte da maior parte de nossos problemas sociais, e que existem formas alternativas viáveis de organização voluntária. E, por definição, o anarquista é o indivíduo que se propõe a criar uma sociedade sem Estado.

Rejeitando o Estado, o anarquista autêntico não está rejeitando a idéia da existência da sociedade; ao contrário, sua visão da sociedade como uma entidade viva se intensifica quando ele considera a abolição do Estado. Na sua opinião, a estrutura piramidal imposta pelo Estado, com um poder que vem de cima para baixo, só poderá ser substituída se a sociedade tornar-se uma rede de relações voluntárias. Ele acredita que a liberdade só pode ser conservada pelo desejo de cooperar e pela realidade da comunidade.

As raízes do pensamento anarquista são antigas. Doutrinas libertárias que sustentavam que, como ser normal, o homem pode viver melhor sem ser governado, já existiam entre os filósofos da Grécia e da China Antiga, e entre seitas cristãs heréticas da Idade Média. Já como movimento ativista - buscando mudar a sociedade por métodos coletivos - o anarquismo pertence unicamente aos séculos XIX e XX.

Talvez a melhor forma de começar uma pesquisa sobre as atividades anarquistas é com o primeiro homem a aceitar o título de anarquista: Joseph Proudhon, um profeta intelectual que declarou:
Ser governado é ser zelado, inspecionado, doutrinado, aconselhado, controlado, assediado, pesado, censurado e ordenado por homens que não têm direito, nem conhecimento ou valor para tanto. Isto é o Estado, esta é sua justiça, esta é sua moral.

Em 1840 Proudhon publicou o livro Qu’est-ce que la proprieté? (O que é a propriedade?). A resposta de Proudhon à pergunta feita a respeito do título do seu livro foi: "Propriedade é roubo". E essa expressão, que identifica o capitalismo e o Estado como os dois principais inimigos da liberdade, tornou-se um dos principais slogans do século.

Talvez o fato mais significativo sobre Proudhon é que, apesar de sua influência e de seus adeptos, ele se recusava a estabelecer uma doutrina dogmática, como a que Marx transmitia a seus seguidores. Quando um admirador lhe cumprimentava pelo seu sistema, ele respondia indignado: "Meu sistema? Eu não tenho sistema!" Ele não acreditava em estruturas teóricas nem em estruturas estatais. As doutrinas, para ele, nunca eram completas. Suas formas e seu significado mudavam conforme a situação, e ele sustentava que a teoria política, como qualquer tipo de idéia, estava num processo de evolução constante.

Proudhon também negava que houvesse fundado um partido político. Para ele, todos os partidos eram "variedades do absolutismo". No sentido formal isto era verdade, embora ele tenha reunido um grupo de discípulos do qual surgiu o primeiro movimento anarquista. Sua ação, quando foi eleito para a Assembléia Constituinte da França durante a Revolução de 1848, esteve relacionada à sua rejeição à idéia de partido político. Ele estava entre a pequena minoria de representantes que votou contra a Constituição aprovada pela Assembléia. Ao explicar suas razões, enfatizou que não votou contra uma forma específica de constituição: "Votei contra a constituição porque era uma constituição". Assim, ele estava reafirmando sua rejeição às formas fixas de organização política.

Assim sendo, nunca foi possível falar no anarquismo como sistema político ou filosófico, como o marxismo, que entende que as obras de um homem que morreu em 1883 fornecem respostas infalíveis a todos os problemas. O anarquismo nunca foi representado por um partido político e consideram as constituições como sistemas políticos fixos, que fortalecem o Estado e institucionalizam o exercício do poder.

Os libertários acreditam que a organização da vida comunitária, a nível político, deve ser substituída por uma organização social e econômica baseada num acordo livre entre os indivíduos. A liberdade não é algo para ser protegido e decretado por leis e Estado. É algo que se faz para si mesmo e que se reparte com os outros. O Estado e a lei são seus inimigos e, de cada ângulo do pensamento anarquista, essa é uma opinião unânime. O Estado é nocivo, e não traz a ordem, mas o conflito. A autoridade impede os impulsos naturais e faz com que os homens sejam estranhos.

Em 1793, em seu grande livro Justiça política, William Godwin levanta a questão:
O Estado lança suas mãos contra a elasticidade da sociedade e pára seu movimento. Dá consistência e permanência aos novos erros. Ele reverte as tendências naturais do nosso pensamento e, ao invés de nos permitir olhar para a frente, nos ensina a procurar a perfeição no passado. Ele nos induz a buscar o bem-estar público sem inovação e melhoramento, mas em nítida reverência aos nossos ancestrais, como se fosse da natureza humana sempre degenerar e nunca avançar.

Os anarquistas sustentam que não podemos usar nossa experiência do presente para planejar o futuro, onde as condições podem ser bem diferentes. Se exigirmos liberdade de escolha, devemos esperar a mesma exigência de nossos sucessores. Podemos apenas tentar eliminar as injustiças que conhecemos.

O anarquista é, na verdade, um discípulo natural do filósofo grego Heráclito, que postulava que a unidade da existência consiste na sua constante mudança. "Sobre aqueles que entram no mesmo rio", disse Heráclito, "as águas que fluem são constantemente diferentes". Essa é uma boa imagem do anarquismo, já que exprime a idéia de uma teoria cheia de variações, que se move entre as margens dos conceitos comuns. Portanto, mesmo havendo diferentes opiniões anarquistas, existe uma filosofia definida, assim como uma tendência anarquista reconhecida. Essa filosofia envolve três elementos: uma crítica à sociedade como ela é, uma visão de uma sociedade alternativa e um planejamento para pôr em prática esta transformação.

A sabedoria chinesa tinha sido descoberta recentemente pelos anarquistas. Para eles, o conceito da unidade da lei natural veio da antiguidade clássica, através dos neoplatônicos e da Alexandria helênica. Na Renascença, Deus foi retirado do seu lugar e/ou racionalizado no princípio da harmonia. Provavelmente o indivíduo mais influente na transmissão deste conceito foi o escritor suíço Jean-Jacques Rousseau, autor das famosas "Confissões".


Rousseau argumentando com seus críticos sobre a validade do pacto social

Rousseau foi acusado de protoliberal, protocomunista e proto-anarquista. Muitos de seus críticos, julgando apenas o seu lado autoritário, consideraram-no o principal responsável pela deificação do Estado que surgiu na Revolução Francesa e em todas as subseqüentes. Sua teoria de um contrato social implícito, pelo qual a autoridade fora estabelecida no passado e comprometera as gerações seguintes, era repugnante para os anarquistas que tinham a idéia de um futuro livre. Apesar das objeções à idéia de um contrato social primitivo, um grande grupo de anarquistas deriva de Rousseau, com sua ênfase romântica na espontaneidade, sua idéia de educação como o desenvolvimento do que é latente na criança de forma que os instintos naturais para o bem e sua percepção das virtudes primitivas são desenvolvidos.

A despeito de Rousseau não ser o primeiro escritor a esboçar o conceito do nobre selvagem, é evidente que os anarquistas receberam principalmente dele sua predileção pelo homem pré-civilizado. Seus artigos descreviam várias sociedades primitivas capazes de conciliar suas obrigações sociais e até mesmo criar culturas razoavelmente elaboradas sem recorrer, pelo menos abertamente, a um sistema de autoridade. O pensamento anárquico está claramente resumido numa frase de Rousseau: "O homem nasceu livre e está acorrentado em toda parte".

Essencialmente, os anarquistas acreditam que, se o homem obedecer às leis naturais da sua própria espécie, será capaz de viver em paz com seus semelhantes. Em outras palavras, o homem pode não ser naturalmente bom mas, segundo os anarquistas, é naturalmente social. São as instituições autoritárias que deformam e atrofiam suas tendências cooperativas. Durante o século XIX, essa idéia foi apoiada por várias teorias da evolução, que foram sendo gradualmente aceitas até o final do século com a publicação da marcante "Origem das espécies", de Charles Darwin, em 1859.
O gigantismo e a impersonalidade do Estado moderno são rejeitados pelo anarquismo. Os anarquistas querem criar um companheirismo entre indivíduos e eliminar o distanciamento entre os homens e o início das atividades sociais necessárias. Portanto, longe de pregar o colapso da sociedade com a destruição do Estado, os anarquistas querem reforçar os laços e os valores sociais através do fortalecimento das relações comunitárias nos níveis mais básicos. Sua idéia é reverter a pirâmide do poder, representada pelo Estado. Entendem que a responsabilidade começa entre indivíduos e pequenos grupos, e não da autoridade que desce do céu político pela escada da burocracia. Ninguém pode avaliar melhor essas necessidades do que aqueles que as sentem.

Aqui deve-se fazer um parênteses e determinar a diferença vital entre anarquistas e marxistas, pelo menos da forma como os marxistas têm atuado. Por causa da teoria de Marx, do domínio do fato econômico na exploração do homem pelo homem, seus seguidores tendem a ignorar as características vitais de outras formas de poder. Como resultado, eles não apenas elaboraram a teoria da ditadura do proletariado, mas também provaram sua invalidade deixando que a ditadura se tornasse um mesquinho governo partidário em todos os países comunistas. Ao ignorar os processos do poder, os revolucionários que se diziam seguidores de Marx destruíram a liberdade com tanta eficácia como qualquer bando de generais sul-americanos.

Os anarquistas têm a irônica vantagem sobre os marxistas de nunca haverem estabelecido uma sociedade livre de acordo com seus ideais, a não ser por pouco tempo e em áreas restritas e, portanto, não podem ser acusados de falhas na sua evolução.


Karl Marx: um amante da natureza e dos animais

As sementes dos grandes movimentos anarquistas estão num trio composto por Pierre-Joseph Proudhon (o primeiro homem a aceitar o rótulo de anarquista com orgulho e desafio), o russo Michael Bakunin, que se ocupava em incitar à insurreição as minorias eslavas no Império Austríaco, e o alemão Karl Marx, notável criador de expressões históricas, que naquela época era a fonte mais irrepreensível da metafísica alemã. A contribuição deste último para aquela união consistia, aparentemente, de longas exposições da filosofia de Hegel para o aperfeiçoamento de seus companheiros. Marx seria o ancestral do atual comunismo autoritário, apesar de ele e de Engels só haverem publicado o Manifesto comunista em 1848. Proudhon e Bakunin se tornariam os fundadores do anarquismo, como um movimento revolucionário social. Com o tempo, as animosidades iriam dividi-los, e mesmo em 1840 suas relações eram cautelosas. Havia um contraste entre o dogmatismo rígido de Marx e a flexibilidade exploratória de Proudhon. Assim falou Bakunin sobre Marx:
Marx e eu éramos amigos naquela época. Nos víamos com freqüência, pois o respeitava por sua sabedoria e devoção séria e apaixonada, ainda que com uma certa vaidade pessoal, à causa do proletariado, e o procurava por sua conversa sempre inteligente e instrutiva. Mas não havia intimidade entre nós. Nossos temperamentos não se adaptavam. Ele me chamava de idealista sentimental, e estava certo. Eu o chamava de vaidoso, traiçoeiro e ardiloso, e eu também estava certo!

Por algum tempo Marx e os dois anarquistas foram da mesma opinião de que as grandes revoluções anteriores ao século XIX, como a Revolução Inglesa do século XVII e as revoluções Francesa e Americana do século XVIII, avançaram pouco em direção a uma sociedade justa, porque foram revoluções políticas e não sociais. Elas reajustaram o padrão de autoridade, dando poder a novas classes, mas não modificaram efetivamente a estrutura social e econômica dos países onde ocorreram. O grande slogan da Revolução Francesa, liberdade, igualdade e fraternidade, se tornou uma piada, uma vez que a igualdade política era impossível sem igualdade econômica. A liberdade dependia de que o povo não fosse escravizado pela propriedade, e a fraternidade era impossível através da brecha que no fim do século XVIII ainda dividia ricos e pobres.

Nem Marx, Bakunin ou Proudhon consideraram a possibilidade de que tais resultados pudessem ser herdados do processo revolucionário, cuja experiência no século XX sugere que sempre se impõe a substituição de uma elite por outra. Mas Proudhon e Bakunin entenderam mais claramente do que Marx que uma revolução que não se desfaz da autoridade criará sempre um poder mais penetrante e mais duradouro do que aquele a que substitui. Eles sustentavam que uma revolução sem autoridade, que destruísse as instituições poderosas e as substituísse por instituições de cooperação voluntária, poderia ocorrer.

Marx foi mais realista. Reconhecia o papel do poder nas revoluções, mas acreditava que era possível criar uma nova forma de poder, o poder do proletariado, através do partido, que ao fim se dissolveria e produziria uma sociedade anarquista ideal, a que ele acreditava ser o objetivo final do esforço humano. Bakunin estava certo ao acusar Marx de ter um excessivo otimismo ao profetizar que a organização política marxista se tornaria uma rígida oligarquia de funcionários e tecnocratas.

Somente em 1860 essas aspirações começaram a aglutinar-se num real movimento anarquista. Durante a onda de revoluções que varreu a Europa em 1848, tanto Bakunin como Proudhon se envolveram. Um ano depois Proudhon foi preso, por suas críticas ao presidente recém-eleito, Luís Napoleão Bonaparte (sobrinho do verdadeiro Napoleão), que mais tarde se tornou imperador com o nome de Napoleão III. Proudhon passou o resto de sua vida na prisão ou no exílio. No fim de sua vida, que se deu em 1865, escreveu D"a capacidade política das classes trabalhadoras", no qual ele sustentava que os partidos políticos eram operados por membros de uma elite social e que os trabalhadores só controlariam seus próprios destinos quando criassem e controlassem suas próprias organizações para mudar a sociedade. Muitos trabalhadores franceses foram influenciados por essas idéias, formando um movimento que visava à regeneração da sociedade por meios econômicos. Se autodenominavam mutualistas, mas eram essencialmente anarquistas, que queriam atingir seus resultados pacificamente, através da cooperação entre produtores.

Das assembléias de 1862 a 1864, entre os discípulos franceses de Proudhon e os sindicatos ingleses, surgiu a Associação Internacional dos Trabalhadores, a Primeira Internacional. Os seguidores de Marx sustentavam que ele havia fundado a Internacional, mas, na verdade, não tomou parte das primeiras negociações. No encontro final em Londres, a 28 de setembro de 1864, onde a Associação foi estabelecida, Marx era apenas "uma figura muda na plataforma", como ele próprio declarou.

Portanto, a Primeira Internacional nunca foi de maioria marxista. Incluía socialistas, vários tipos de anarquistas e pessoas que não eram de nenhum dos dois. Ninguém sabe quantos membros teve. Tanto seus defensores, como seus inimigos, por várias razões, tendem a exagerar seu número de sócios e sua influência. Não há dúvida que, principalmente nos países de língua latina da Europa Meridional, a Associação estimulou os operários e os camponeses a lutar por seus direitos, como nunca haviam feito antes.

Mas, através de toda devoção e elevadas aspirações, a Internacional se tornou um campo de batalha de ideologias e de personalidades. Proudhon estava morto quando a Associação se tornou uma organização ativa, em 1865, e as diferenças que começaram a aparecer entre o trio de revolucionários, havia muitos anos em Paris, sobreviveram e se ampliaram na Internacional. O conflito entre Marx e Bakunin não apenas refletiu diferenças de temperamento entre os protagonistas, mas também diferenças fundamentais de idéias, ou seja, de finalidades entre socialistas autoritários e anarquistas libertários. Marx e seus seguidores, que tinham melhor tática, conseguiram firmar-se em posição de poder organizacional. Foi Marx que redigiu as regras da Associação e obteve controle virtual do Conselho Geral, estabelecido em Londres. Sua influência nas sucursais, principalmente nos países latinos, não era tão forte, e os congressos anuais tornaram-se batalhas entre Marx e Bakunin (que liderava os contingentes espanhóis, italianos e franco-suíços). Autoritários contra libertários, ação política contra ação industrial, ditadura do proletariado transitória contra abolição imediata de todos os poderes do Estado: o debate continuou, e os dois pontos de vista eram irreconciliáveis. O debate transformou-se em conflito, e em 1872 os marxistas expulsaram Bakunin e transferiram o Conselho Geral para Nova York, onde ficaria fora do alcance dos anarquistas. Por isso, a organização morreu em 1874. Entretanto, os anarquistas estabeleceram sua Internacional rival, que sobreviveu aos restos marxistas por três anos e terminou em 1877.

O movimento anarquista sobreviveu como uma ideologia e não como organização em grupos isolados e indivíduos que se mantinham em contato, fazendo conferências que amedrontavam os doutores e raramente os unia. Alguns indivíduos dedicados e talentosos, como Peter Kropotkin e Errico Malatesta, moldaram a ideologia anarquista entre 1880 e 1900. Em um extremo estavam os seguidores de Leon Tolstoi, que pregava a resistência não-violenta, que influenciou Gandhi na sua estratégia do Satyagraha (desobediência civil), que finalmente deu independência à Índia. Outros devotaram-se às escolas livres ou às comunidades onde se tentava viver comunitariamente, sem as restrições impostas pela teoria utópica. Outros, ainda, buscaram a aliança entre o anarquismo e a revolução do movimento artístico que, na mudança do século, iniciou o movimento modernista na Europa e principalmente na França. Pintores como Pissarro, Signac, Valminck e o jovem Picasso se autodenominaram anarquistas, assim como o poeta Mallarmé e o escritor Oscar Wilde.
Durante um breve período que infestou a história do anarquismo, alguns indivíduos isolados praticaram o assassinato de personagens simbólicos, para chamar atenção à injustiça. Durante a década de 1890, foram vítimas um rei da Itália, um presidente da França, um presidente dos Estados Unidos, uma imperatriz da Áustria e um primeiro-ministro espanhol. A maioria dos anarquistas nada tinha a ver com tais atos e consideravam-no com sentimentos variados, até que muitos reagiram horrorizados - como o novelista anarquista francês, Octave Mirabeau - quando Emill Henry jogou uma bomba num café, matando pessoas inocentes. Disse Mirabeau:
Um inimigo mortal do anarquismo não poderia agir com mais perfeição que Henry quando jogou sua inexplicável bomba no meio de pessoas pacíficas e anônimas. Henry diz, afirma e declara que é um anarquista. É possível. Todo partido tem seus criminosos e seus idiotas, porque todo partido tem seus homens.



Tudo o que eu queria era ser livre como uma borboleta. The hiiiiiiills are alive with the sound of muuuusic...

O terrorismo morreu rapidamente como método anarquista, exceto na Espanha e na Rússia, onde todos os métodos políticos têm sido tradicionalmente violentos. Apenas alguns anarquistas o praticaram, e pensar que o anarquista é um homem com uma bomba é o mesmo que considerar um católico como um dinamitador por causa de Guy Fawkes. Os movimentos são manifestados através das ações dos indivíduos, mas devemos distinguir uma pessoa de sua idéia, e a idéia do anarquismo nunca foi invalidada pelo extremismo de fanáticos.

O anarquismo recuperou-se rapidamente dos danos causados pelos terroristas. No final do século teve sua fase de grande influência no desenvolvimento de um movimento de criação de uniões livres de sindicatos. O movimento se autodenominou anarco-sindicalismo. Sua idéia essencial era que os sindicatos deviam ser considerados não apenas instrumentos para conseguir melhores salários, mas agentes de transformação da sociedade. Os sindicatos estariam em constante luta pela mudança da sociedade através do método clássico da greve geral, tomando e administrando os meios de produção durante a revolução, para formar a infra-estrutura da nova sociedade.

Foi na Espanha que o anarco-sindicalismo, assim como o anarquismo, atingiu seu apogeu. Atraía os espanhóis por suas qualidades morais e idealistas; tornou-se não apenas um movimento político, mas tinha uma articulação quase religiosa de caráter puritano, que lhes deu uma Constituição Substituta. Teve seu apogeu na década de 30, com a Confederação Nacional dos Trabalhadores (CNT), que tinha mais de 2 milhões de membros. Seu fim foi durante a Guerra Civil Espanhola, nos últimos anos da mesma década. Na Espanha, os anarquistas demonstraram a eficiência de seus métodos de prática; falharam na coordenação do movimento numa escala maior, mas, em Barcelona, a tática anarquista nos conflitos de rua derrotou os generais de Franco. Similarmente, nas áreas rurais, os camponeses estabeleceram comunas livres, que mesmo seus críticos mais ácidos ficaram impressionados pela eficácia natural e pela resistência espartana dos grupos que viviam de acordo com os ensinamentos dos profetas comunistas do século XIX. Toda essa camaradagem e auto-sacrifício, que demonstrava a possibilidade de prática da teoria anarquista por pequenos grupos, estava condenada a desaparecer porque a espontaneidade e a ação voluntária eram estranhas ao espírito de guerra, totalitário por natureza. Os anarquistas não puderam resistir aos fascistas que avançaram sobre as comunas do Sul, destruindo-as; nem aos comunistas que minaram a posição anarquista atrás das linhas republicanas. Dois anos de guerra e intriga política enfraqueceram os anarquistas espanhóis.



Em 1936 Hitler "emprestou" a Franco sua recém-recriada aviação, a Luftwaffe, pra treinar seus homens, máquinas e táticas (que seriam empregadas na 2ª guerra) durante a guerra civil espanhola, no extermínio da Frente Popular através de "bombardeios estratégicos" a cidades (uma novidade, até então). A "experiência" se mostrou um sucesso, e Hitler dava assim um recado claro à Europa de que a Alemanha havia renascido como potência militar. O pintor espanhol Pablo Picasso, em seu exílio na França, retratou o horror do bombardeio à cidade de Guernica com o quadro "O grito" (acima).


O movimento histórico criado por Bakunin e Proudhon morreu quando os exércitos de Franco marcharam sem oposição sobre Barcelona. Mas isto não ocorreu ao movimento anarquista, que renasceu na última década como a gênese do fogo de sua própria transformação.

A 2ª Guerra Mundial, que se seguiu à vitória de Franco, completou o colapso do movimento anarquista internacional. Na Rússia, depois da Revolução de Outubro de 1917, os bolcheviques consideravam os anarquistas seus principais rivais e eliminaram-os. O advento do fascismo na Itália e do nazismo na Alemanha significou o fim do movimento anarquista em ambos os países, e os únicos anarquistas livres e ativos estavam na Inglaterra, nos Estados Unidos, na Suíça e em países latino-americanos mais liberais, dos quais o México era o mais importante. Todos os países onde havia existido um movimento anarquista de massa, como Rússia, França, Itália e Espanha, estavam sob regime totalitário em 1942. Por conta disso, surgiu uma nova situação na história anarquista: Durante a 2ª Guerra, foi nos países de língua inglesa que o anarquismo demonstrou a maior vitalidade, e a tradição foi interpretada de uma forma totalmente nova. O estímulo não veio apenas dos refugiados, mas também de escritores originados do movimento modernista, que conheceram o anarquismo através de Oscar Wilde, William Morris e William Godwin.

Essa tendência do anarquismo, de alojar-se durante a década de 40 como uma semente nas opiniões dos intelectuais de língua inglesa, levou a interessantes desenvolvimentos teóricos, principalmente no campo da ciência e da educação. Os ensinamentos de Erich Fromm, especialmente em "O medo da liberdade", influenciaram os anarquistas em 1940, assim como a herética doutrina freudiana de Wilhelm Reich, que relacionava a repressão política com a psicologia e buscou na neurose as origens do poder coercitivo. O escritor anarquista mais influenciado pela teoria psicológica moderna foi Herbert Read, que adicionou às teorias de Freud, Adler e especialmente às de Jung outra característica concepção da teoria anarquista de 1940: o reconhecimento da necessidade de um novo tipo de educação que habilitaria o homem a aceitar e preservar a liberdade.

Herbert Read sustentava que o sistema educacional como existia, com sua ênfase ao estudo meramente acadêmico, preparava os homens à obediência, não para a liberdade. Em seus livros, como Educação através da arte e Educação de homens livres, argumentava que as escolas deviam ser modificadas para educar os sentidos, antes de atingirem a mente. A personalidade harmônica, que resulta da educação através da arte, não só traria vida individual mais equilibrada, mas também atingiria com o menor distúrbio possível a pacífica transformação da sociedade que os anarquistas sempre sonharam; uma transformação em que as pessoas que estivessem em paz consigo mesmas e, portanto, em paz com os outros pudessem fazer com que a igualdade e a fraternidade fossem compatíveis com a liberdade.

A característica marcante do neo-anarquismo que emergiu na Inglaterra e nos Estados Unidos no pós-guerra, assim como outros movimentos de protesto, foi a de que representou, principalmente, uma tendência entre os jovens e especialmente dos jovens da classe média. Movimentos anarquistas passados compunham-se principalmente de artistas e camponeses, com poucos líderes intelectuais recrutados na inteligentsia da classe média e alta. Mas, em 1962, uma pesquisa do jornal anarquista britânico Freedom revelou que, na Inglaterra, apenas 15% dos anarquistas pertenciam a tradicionais grupos de camponeses e operários; dos restantes 85%, o maior grupo consistia de professores e estudantes, e havia ainda muitos arquitetos, médicos, jornalistas e pessoas trabalhando independentemente como artistas ou artesãos. Proporções bastante similares existem nos movimentos anarquistas na maioria dos países do Ocidente. O novo libertarismo tem sido essencialmente uma revolta, não dos menos privilegiados e certamente não dos trabalhadores habilitados, os quais estão ocupados em defender suas recentes vitórias quanto ao padrão de vida, mas sim dos privilegiados que vêem a futilidade da riqueza como uma meta.

Sem dúvida, um dos fatores que tem tornado o anarquismo popular entre os jovens é a sua oposição às culturas industriais tecnocráticas e crescentemente centralizadoras da Europa Ocidental, da América do Norte, do Japão e da Rússia. Neste contexto, uma importante figura moderadora, apesar de os anarquistas ortodoxos nunca a terem aceitado, foi Aldous Huxley. O pacifismo de Huxley e sua visão da iminência de uma explosão demográfica, da destruição ecológica e da manipulação psicológica, tudo isto reunido numa visão social que, de várias formas, antecipou a preocupação do neo-anarquismo durante os anos 60 e 70. Já em 1930, em "Admirável mundo novo", Huxley apresentou a primeira advertência sobre o tipo de alienação e de existência materialista produzido numa sociedade dominada pela tecnologia. No prefácio da edição de 1946 de seu livro, Huxley declarou que os perigos implícitos na tendência da vida moderna só poderiam ser rechaçados por meio de uma mudança radical para a descentralização e a simplificação em termos econômicos e formas políticas.

O movimento no qual as idéias anarquistas talvez salientaram-se mais dramaticamente nos últimos anos foi o de Paris, na insurreição de 1968. De forma espontânea (onde os líderes dos partidos de esquerda e dos sindicatos tinham pouco controle) se realizou algo semelhante ao antigo esquema anarquista por uma revolução libertadora. Os estudantes ocuparam as universidades, hastearam a bandeira negra dos anarquistas no Bourse e incitaram os trabalhadores à greve e se reuniram em frente às fábricas. Por alguns dias o poderio de De Gaulle – e o nacionalismo que representava – ficou pendurado na balança; só mesmo um acordo feito com seus inimigos no exército fez com que seu domínio se mantivesse por tempo suficiente para que as forças conservadoras da sociedade francesa pudessem se reafirmar. Os acontecimentos em Paris demonstraram, assim como os similares em Atenas, Bangkok e outros lugares, que, apesar de suas sofisticadas técnicas de manter o poder, governos modernos são quase tão vulneráveis como seus predecessores, e, de certa forma, ainda mais vulneráveis, já que a sociedade contemporânea tornou-se envolvida numa máquina burocrática com uma estrutura de tal forma encadeada que mesmo uma pequena falha em seu funcionamento terá efeitos enormes.

Porém, devemos ter em mente que em nenhum lugar, nos últimos anos, uma rebelião espontânea resultou numa mudança da atual estrutura de poder. Os governos podem ter mudado, mas o padrão de autoridade não tem sido fundamentalmente rompido.

Até agora, de fato, tem havido pouco progresso no uso dos conceitos anarquistas de uma maior organização da sociedade, e é aqui que os críticos sentem que estão em chão mais firme, quando falam da dificuldade de manipular a indústria de massa e as massas populacionais, por métodos anarquistas. Mais ainda, não é impossível que a tecnologia possa oferecer alguns dos meios para este fim. A tecnologia por si só é neutra e, como Lewis Munford demonstrou muito tempo atrás em "Técnicas e civilização", não há nada que afirme que uma sociedade tecnologicamente desenvolvida precise ser tanto centralizada como autoritária ou ecologicamente destrutiva. E é possível, para dar um exemplo, que chegue uma época em que o povo, no controle de sua tecnologia, possa usar as comunicações eletrônicas para informar-se de todos os aspectos de uma questão pública e usar os mesmos meios para tornar conhecidos e eficazes os seus desejos, sem intermediários. Desse modo, a instituição do plebiscito, que por ser hoje tão mal feita é raramente usada, poderia ser aplicada a todas as decisões importantes, e os plebiscitos poderiam ser ajustados às particularidades efetivamente afetadas por uma decisão. A democracia deve então ser direta e ativa novamente, como fora antes, pelo menos para os cidadãos, na antiga Atenas. E, se uma democracia eficaz, participatória e direta não pode ser a sociedade naturalmente ordenada da anarquia, ela poderia ainda representar um passo histórico nessa direção.


Tradução: Betina Becker

Este texto é uma seleção de trechos de uma longa introdução escrita por George Woodcock para seu livro "The Anarchist Reader’s", que reúne alguns textos clássicos da doutrina anarquista. Woodcock é considerado o melhor especialista nos Estados Unidos no assunto.

Anarco-Individualismo e Transhumanismo:






Publicado em novembro 18, 2008 por diegocaleiro

A vida é apenas uma e a racionalidade é um bom approach a ela, esse é o princípio regente, ou fundamento, da visão política de mundo que pretendo aqui descrever.

É adotada também a trivialidade de que a palavra “felicidade” foi adotada pela comunidade para denotar algo que é bom, e vem sendo usada dessa forma desde então.

Uma das grandes características marcantes das posições políticas dos indivíduos é seu caráter expansionista, a grande maioria das pessoas em atividade política se interessa por expandir o número de pessoas que tem a mesma opinião que elas, uma posição política que não pelo menos flerte com esse viés bolchevique estará fadada ao fracasso, por razões de seleção memética devidamente discutidas por Jared Diamond em Armas Germes e Aço. Começo minha exposição então declarando abertamente a derrota da posição política que pratico no longo prazo.

A racionalidade nos permite ver que o outro é diferente de nós, ela nos desvia do ideal cristão da única maneira correta de se viver, e portanto ela não nos permite cegar à possibilidade de que aquilo que nos é bom talvez não o seja ao outro; a razão e a fibra política caminham em direções opostas, o que explica a lentidão do desenvolvimento político do mundo, em contraposição, por exemplo, ao desenvolvimento artístico, ou científico. O anarco-individualista não dá importância ao processo de credibilidade por pregação, acreditando no que acredita independentemente de quantas pessoas partilham de suas crenças. Segue que a não aceitação por outra pessoa da premissa inicial, do fundamento, não oferece perigo algum ao proponente dessa posição, que ao mesmo tempo recusa-se a aceitar que há uma melhor visão política para todos e que suas idéias devem ser inculcadas no maior número possível de mentes.

Uma vez que nos afastamos dos Gulags mentais promovidos pela histeria política de massas, podemos nos afixar numa racionalidade individual, e trazer o anarco individualismo e o transhumanismo social a tona a partir de nossas premissas.

O anarquismo tradicional está ligado a uma recusa do Estado e uma percepção de que a comunidade viveria melhor num âmbito sem poder estatal. Essa visão se baseia numa miopia psicológica (não perceber que a natureza humana é contrária aos anseios humanos) aliada a uma paranóia de conspiração (o Estado nos vigia, nos pune, quer o pior de mim, e violenta minha liberdade). Nós, anarco individualistas, desejamos paz e ausência de medo, e conhecemos em parte a natureza humana, que possibilitou não só a construção de grandes maravilhas do mundo e a era da internet, como também a tortura de crianças e o estupro de inocentes, e por isso nós podemos nos afastar dessa concepção anarco-tradicional de que todo homem seja um herói cuja história não pode ser escrita devido ao punho esmagador do Grande Irmão. O anarco-individualismo apenas prega uma separação estrita entre indivíduo e estado, o argumento é simples: 1 Nenhum indivíduo tem uma participação política relevante caso não seja famoso, 2 só há uma vida que não deve ser utilizada em coisas irrelevantes, logo, 3 não se deve participar politicamente. Cada minuto dedicado a política pela política, e não pelo prazer de seus conteúdos, ou por razões que lho possam interessar, é uma antecipação da morte em um minuto.

É um prazer ao ser humano fazer o bem a si mesmo e aqueles que lho interessam, e nossa capacidade de simbolização nos permite também fazer o bem a coisas, instituições, idéias, projetos etc… e sentir imenso prazer com isso. Em realidade sabe-se que as mais felizes e longevas dentre as almas do mundo são aquelas que dedicam-se a algo que lhes parece maior do que elas. Segue que devemos procurar campos de interesse aos quais possamos nos dedicar para que aproveitemos bem a vida. Depois da virada de jogo da racionalidade e do iluminismo, tornou-se impossível a pessoas inteligentes e bem informadas na infância manter uma sólida aspiração religiosa ou transcendente, e Richard Rorty pontua que esse processo foi essencialmente um abandono da idéia de imortalidade pessoal em direção a um esforço para que as pessoas do futuro vivam uma vida melhor, e considera isso um progresso. Como pessoas do futuro em relação ao passado, temos boas razões para agradecer a essas mudanças, e mesmo que não tivéssemos, estamos circunscritos num espaço de tempo no qual é impossível atingir o grau de transcendentalismo e misticalismo que outrora povoou o imaginário humano, e portanto temos de nos ater aquilo que está no imaginário coletivo (porque isso nos dá segurança) e está acessível a nós como um projeto de vida que é mais importante do que nós. Devemos portanto encontrar algo maior do que nós e fazer. Note que não é uma premissa que devemos fazer algo maior do que nós para os outros, é uma consequência da busca por um maior aproveitamento da vida no nível individual que nos traz inexoravelmente a uma ética pública (mas não política) que pretende promover a melhoria da vida alheia. Considerando que instituições, idéias, comunidades, e memeplexos em geral são mais estáveis emocionalmente do que pessoas particulares, dedicar-se prioritariamente a entes estáveis é uma boa maneira de garantir o próprio aproveitamento da vida, em oposição a dedicar-se primordialmente a conhecidos. O outro, ou a instituição beneficiária raramente estão no passado (historiadores seriam um exemplo) e segue portanto que a maioria dos afazeres de um anarco-individualista serão dedicados ao futuro, ergo, progressismo.

Dependendo do grau de racionalidade e do tipo de empatia que uma pessoa tem, ela irá se dedicar a um tipo diferente de atividade. A maioria das pessoas precisa de constante feedback sobre seus atos para sentir-se bem, e particulamente um feedback que seja visto na hora, em pessoa. Um psicólogo clínico por exemplo dedica-se ao momento atual de uma pessoa e também a seus momentos futuros, e recebe informação atualizada de como vão seus esforços duas vezes por semana, um webdesigner por outro lado dificilmente pode ver o fruto de seus esforços diretamente (no sentido de ver os usuários se divertindo com tão bela página) e isso requer um maior grau de racionalidade ou menor grau de empatia. Racionalidade e empatia, evidente, não são antônimos, mas é o caso no mundo atual que a copiabilidade de algo está intimamente ligada a não ver todas as cópias, e a empatia depende daquilo que vemos em curta distância, ou seja os atos que privilegiam mais pessoas e são mais racionais são aqueles que possibilitam uma ativação empática menor.Esse é um problema do mundo, e não das minhas definições de racionalidade e empatia. Como fazer atos universais é uma consequência, e não uma premissa, da racionalidade e da vida curta, uma pessoa mais empática deve sacrificar o maior bem geral em prol de seu bem individual, pois sua felicidade depende de fazer bem a menos pessoas. Uma pessoa bastante racional e pouco empática por outro lado, mesmo que tenha a escolha entre um bem maior não visível a curto prazo, e um bem menor porém visível há de compreender que sua raridade faz com que ainda mais valiosos sejam seus esforços em prol de um mundo melhor. Os grandes filósofos, literatos, cientistas e arquitetos são pessoas justamente desse tipo. Sua capacidade de abstração permite compreenderem que é possível que aquilo que há de melhor para se fazer na vida pública é produzir algo que será apreciado ao longo de gerações e gerações no futuro, e apenas pela capacidade de prever o futuro mentalmente, sentir o prazer empático correspondente. O principal perigo da política é justamente a roupagem racional de “estar fazendo bem aos seus conterrâneos e futuros cidadãos”, vende-se o lobo na pele de cordeiro, pois evidente que uma pessoa não faz nenhuma diferença individual na política, entretanto os esforços de apenas um são muito mais prolíficos em outros campos da cultura.

Há pessoas que uma parte do tempo (mas não todo ele), por qualquer razão, apreciam imensamente a quantidade real de influência que provavelmente farão no mundo, pessoas por exemplo que se sentem melhor fazendo o bem a 3 chineses do que a 2 indianos, e melhor fazendo um pequeno bem a uma cidade de um milhão de habitantes do que resolvendo os problemas de uma única pessoa. A essas pessoas cabe o estudo dos melhores métodos de se promover o maior bem para o maior número de pessoas.

No passado esse modo de pensamento gerou o humanismo, o enaltecimento do homem enquanto homem, e a intenção de permitir-lhe exercer ao máximo potencial todas as suas faculdades. Com o progresso tecnológico surgiu entretanto uma divisão entre humanistas naturalistas, que cometem o tradicionalérrimo erro de assumir que o que é natural é bom (e consequentemente precisam definir o que é natural para separar o joio do trigo e passam o resto da vida separando o hipotético joio do hipotético trigo e percebendo como suas definições anteriores falharam), e os transhumanistas, que extendem seus princípios humanistas para uma promoção da vida humana em todos os âmbitos inclusive aqueles que dizem respeito a desafiar as tiranias da seleção natural e da hereditariedade. Esses acreditam que é tão bom treinar um grande pintor quanto é bom dar-lhe as tintas para que possa pintar. Os primeiros acham que treinar um pintor é bom, mas não se deve dar a ele pincel ou tintas. Não é exatamente assim, mas isso captura o espírito anti-tecnológico dos humanistas naturalistas.

A história humana é um sem fim de aprender a ordenar a natureza de acordo com nossos fins, e nisso só difere por exemplo da história paquiderme no que tange ao fato de que nossa ambidestria e capacidade linguística nos permitiram influir muito mais intensamente que sua nosodestria e capacidade chafarística.

O anarco tranhumanismo é assim sumarizado por seu criador Pablo Stafforini:

Anarchism: The political theory that aims to create a society free of all forms of authority, particularly those involving domination and exploitation.

Transhumanism: The cultural movement that affirms the desirability of fundamentally altering the human condition through applied science and technology.

Anarcho-Transhumanism stands for:

*

Political Freedom: Against the tyranny of government.

*

Economic Freedom: Against the tyranny of capitalism.

*

Biological Freedom: Against the tyranny of genes.

Anarcho-Transhumanism is not:

Libertarian: It does not believe in free-market fantasies.

Extropian: It does not believe in optimistic futurism.

A diferença entre a posição que estou defendendo e a de Pablo é apenas na forma de frasear, ele se diz contra a tirania do Governo, enquanto eu diria ser contra o que há de tirânico no governo, o que deixa claro a eliminação da interpretação de que o governo é uma tirania, em oposição a interpretação mais cautelosa de que existem tiranias no governo, tal qual existem no capitalismo e nos genes.

Existem poucas maneiras de se conseguir mais inimigos no mundo do que sendo um anarco individualista transhumanista social, e acho que qualquer pessoa que esteja levando a sério sair do armário como um pense nisso antes de fazê-lo.

Todas as vertentes políticas dominantes, da extrema direita a extrema esquerda o criticarão por não ser politicamente ativo, afinal, tal qual os fiéis de qualquer religião, eles consideram que o que fazem é mais certo de acordo com quantas pessoas fazem o mesmo, e você estará lhes oferecendo tacitamente a perspectiva de que existe um outro caminho possível, o que, por possuirem uma natureza política, é o que mais repudiam.

Todas as pessoas, inclusive anarquistas ativistas criticarão sua neutralidade política, ou apatia, e sua incapacidade de sensibilizar-se com os problemas do mundo (mais miopia). A visão de longo alcance no espaço já é malvista em comunidades, a visão de longo alcance no tempo é um atentado sem precedentes.

A enorme maioria das pessoas vive do início ao fim da vida achando que o que é natural é bom e que as coisas deveriam ser como são. Não espere críticas apenas da comunidade religiosa, ou de pessoas espiritualistas, as pedras virão desde a elite financeira que não consegue aceitar alguém que não tem fetiche pelo bem mais disputado (o dinheiro), até Nietzscheanos vorazes que lhe chamarão de ovelha submissa por seus ideais baseados em outros e sua dedicação a superar a própria vontade de poder. Não apenas estes, mas também teóricos sociais da esquerda tradicional criticarão sua aceitação do determinismo biológico (um pressuposto para desejar modificá-lo) como nazista; estruturalistas dirão que sua visão progressista e de uma verdade única lhes inspira náusea, apesar de que a recusa destes de uma verdade (mesmo aproximada) sobre os fatos não lhes impeça de pregar cegamente uma maneira única do bem viver a ser conduzido pelo torpe estado de seus sonhos, que pressupõe uma visão do homem como uma tábula rasa e ignora completamente a natureza humana.

Trilha sonora para os próximos parágrafos:

Inelutavelmente você será criticado como pertencendo a grupos que lhe repudiam. É natural ao homem estereotipar o estranho num grupo pré-estabelecido, de preferência inimigo, para poder manter-se tranquilo a respeito de suas próprias escolhas e emocionalmente bem consigo mesmo. Os esquerdistas lhe chamarão de nazista, os capitalistas mais ferrenhos, de comunista, os anarquistas ativistas de fraco, todos de apático, os religiosos de ímpio, aqueles que misturam o natural e o bom mais uma vez de nazista, os relativistas lhe chamarão de tudo o que puderem, contanto que eles não tenham que admitir que existem coisas em algum sentido aproximadamente verdadeiras e portanto tenham de tomar alguma providência para obter informação sobre o mundo. Como sua obra será de longo prazo, e não uma atividade física intensa como discutir política todo o tempo, a critica da apatia virá acompanhada da impressionante alegação de que você estuda de mais ou lê demais e não faz nada. Nesse caso não se trata apenas de miopia a respeito de seus projetos, mas sim de um violento medo de que talvez, apenas talvez, alguém que tanto estude possa realmente saber alguma coisa. Por sorte esse medo pode sempre ser suprimido pela próxima reunião do grupo ao qual a pessoa pertence, um baseado ou a novela das oito, mas é sempre possível vê-lo ressurgindo novamente quando o conhecimento entra em jogo numa conversa, o que para alguns é uma fonte de regozijo apenas comparável ao bem futuro que se está defendendo.

Esse preço todo é pago por uma vida na qual não há limites para o aprendizado, fronteiras para a liberdade e o amor ao próximo (sequer espaço-temporais) e na qual cada momento se preenche de significado de maneira única de uma maneira que só pode ser transmitida por aqueles que sabem estar servindo a um propósito maior do que si mesmos, como os religiosos verdadeiros. É bastante claro, e digo isso literalmente ao som da cavalgada das walkyrias, que o pensamento anarco individualista transhumanista social não é para todos, mas apenas têm serventia a uma pequena minoria de pessoas que tem uma série de particularidades de personalidade e uma visão de mundo que considera importante o fato de que a vida é uma só. O tipo de racionalidade, desejo de ascenção, vontade de poder, desejo de liberdade, generosidade e individualismo exigido para se sustentar essa posição no mundo são muito pouco frequentes na população humana, e isso, àqueles que ainda não aprenderam a diferenciar o que é fato ou valor, apenas descreve como é a realidade e nada diz sobre quão bom ou ruim é adotar essa perspectiva.

.

18/11/2008 Diego Caleiro

sábado, 23 de outubro de 2010

Manifestação pelo voto facultativo:












Dia 30 de Outubro(véspera do segundo turno),vamos novamente LUTAR contra o autoritarismo governamental e exigir o VOTO FACULTATIVO.
O processo de abertura democrática tem que ser completo.Chega de abaixar a cabeça.
Neste ano, 18,12% dos eleitores não votaram, o que dá 24,6 milhões de votos não validados contra 111,1 milhões computados.

Não estamos abrindo mão do direito de escolher,queremos sim que isso seja um DIREITO e não uma OBRIGAÇÃO.
Contamos com a participação de todos que não aceitam mais ser massa de manobra.
.
Dia 30 de outubro(sábado),concentração as 13:00 no Vão livre do Masp(Av:Paulista)

Anarquista, anti-militarista e mulher livre:


Amparo Poch Gascón (Zaragoza 1902 – Toulouse 1968)
08/03/2010
por Antinatoportugal


Anarquista zaragozana, médica e feminista, Amparo Poch y Gascón, nasceu em 15 de outubro de 1902 no sei de uma família trabalhadora. Apesar da sua humilde origem foi uma das primeiras mulheres licenciadas em Medicina que obteve o prêmio extraordinário de fim de carreira traduzindo-se no seu caso, na obtenção da qualificação de Matrícula de honra em todas as mudanças de grau.

Amparo destacou-se não só pela diminuta presença de mulheres nas aulas durante a década de vinte na Espanha, mas também por possuir um potencial lutador, intelectual e crítico que aplicou tanto na área da saúde como no setor social e sexual.

Profundamente comprometida, Amparo Poch divulgou tudo o que aprendeu na sua carreira, aproximando-se das classes mais desfavorecidas, para evitar as terríveis enfermidades, fruto da educação machista imperante. Preocupava-a terrivelmente o resultado da ignorância induzida por um estado que tratava, como ainda hoje, de controlar deste modo a mulher e o conjunto da sociedade

Assim, dedicou-se fervorosamente à divulgação de medidas básicas de higiene, clarificações a respeito do conceito de maternidade, a divisão de papéis de gênero e outras questões com o objetivo claro e emancipador para a mulher.

Para além de ofertar cursos e conferências, teve tempo de escrever obras como “A vida sexual da mulher” 1932, o “Elogio do amor livre” que defendeu e praticou ao longo da sua vida. Assim como numerosos artigos sempre para a imprensa libertária: “Revista Blanca”, “Tiempos Nuevos”, “Tierra y Libertad”, “Generación Consciente”, “Estudios” ou “Mujeres Libres”, sendo co-fundadora desta última juntamente com Mercedes Camposada e Lucía Sánchez Saornil.

Em 1936 chegou a ser proposta para Ministra da Saúde, mas a sua declarada persistência à resistência do setor da FAI evitou a consecução do cargo embora ainda tenha colaborado com Federica Montseny, que ostentava o dito ministério.

Em Valência, foi nomeada diretora de assistência social onde se encarregava de meninos refugiados provenientes de diversas zonas em conflito. No começo da guerra civil espanhola destacou-se, também, por praticar a medicina em hospitais de campanha e de sangue da cidade de Madri.

Em 1937 esta anarquista e mulher libertária mudava-se para a cidade condal onde foi nomeada responsável da Casa da Mulher Trabalhadora, espaço de intercâmbio e educação para as mulheres onde uma vez mais trabalhou até à exaustão. No ano seguinte à sua chegada a Barcelona, Poch forma parte da equipe de redação do periódico sindicalista “Mañana” assinando então como “Doctora Salud Alegre”, tratando uma vez mais de ser fiel ao seu absoluto otimismo na Espanha anterior ao franquismo.

Assim, como em Valência, colaborou no instituto “Mujeres Libres”, em Barcelona, exercendo o cargo de direção do Casal da Dona Trabalhadora, estabelecendo as bases de um feminismo mais pedagógico, com vista a se alcançar a libertação e a igualdade sexual da sociedade – que sempre padeceu e padece ainda hoje - às conseqüências de um sistema machista e patriarcal.

Mulher simples e renitente à exibição pessoal, atua peculiarmente devido à sua inquietude cultural, social, feminista, ecológica e com um elevado sentido de independência. Utiliza os seus escritos, com uma linguagem acessível, para chegar tanto às mulheres da classe trabalhadora como nas universidades, para ela era necessário trabalhar para uma revolução social. Todos os seus trabalhos e esforços iam na direção que defendia e praticava o amor livre.

Após a guerra civil, em 1939, exila-se na França onde, para além de continuar dando a conhecer as suas idéias, tenta socorrer os milhares de refugiados dos campos de concentração. Dirigirá o hospital de Varsóvia em Toulouse, por onde passarão numerosos combatentes espanhóis.

Conhecida como uma mulher alegre e com grande vitalidade, culta, pacifista, amante da liberdade e inimiga da guerra, apesar de ter tido de sofrer a barbárie militar, lutou por uma sociedade igualitária onde não tinham lugar as armas, somente a palavra, a cultura e a solidariedade.

Mulher anarquista, mulher lutadora, mulher livre, exemplo para todas nós. Morre em Toulouse em 15 de abril de 1968.

Marisa Cucala, Secretaria da Mulher da CGT Aragón y La Rioja, Espanha.

Tradução > Liberdade à Solta

agência de notícias anarquistas

Anarquismo e feminismo:


ANARQUISMO E FEMINISMO: as mulheres anarquistas em São
Paulo na Primeira República (1889 -1930).


Samanta Colhado Mendes (Pós-graduanda da Universidade
Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” – Faculdade de
História, Direito e Serviço Social – C. Franca)

É muito comum hoje falarmos que vivemos uma época de libertação sexual,
em que a mulher já é totalmente emancipada e alcançou todos os espaços sociais.
No entanto, pouco sabemos sobre os movimentos feministas ao longo da história e
as lutas que travam, ainda hoje, pela abolição do machismo, ainda tão presente na
sociedade, e contra as imagens estigmatizadas e incorporadas pelas mais variadas
classes sociais com relação à mulher. O presente artigo visa mostrar uma vertente
do feminismo – o anarco-feminismo – e o movimento das mulheres operárias em
São Paulo em um período tão importante na história dessa cidade. O que se torna
possível através dos aspectos teóricos da História Social, que visa resgatar na
disciplina história, indivíduos e sua experiência coletiva até então suprimidos dela.

As mulheres anarquistas - ao contrário do que afirmam autores como Ignacio
Soriano em seu prólogo ao livro de Emma Goldman “Viviendo mi vida” (1996),
quando coloca que Emma foi uma das maiores divulgadoras do anarquismo e não
inovadora – começaram a colocar questões que, até então, não eram colocadas
pelo anarquismo clássico, como por exemplo, o amor livre, a maternidade livre e
consciente, a livre união, o exercício livre do sexo (vale acrescentar que as
anarquistas observam o sexo como algo natural e benéfico, ao contrário do que
coloca a moral burguesa) e a emancipação da mulher (moral, sexual, política,
econômica, intelectual e cultural). É plenamente adequado dizermos que elas
inovaram, deram um novo viés, um novo enfoque ao anarquismo, tanto em termos
teóricos, como em termos de atuação no movimento. Apresentando uma nova
vertente dentro desse corpo de pensamento tão vasto que é o anarquismo, o
anarco-feminismo. As mulheres não foram meras coadjuvantes na teoria e prática
anarquista, mas que atuaram e, mais ainda, atuaram como mulheres, mostrando a
opressão sentida por elas mesmas em todos os termos (que vão da moral até à
economia e a política); e que claramente se expressa na vida cotidiana e no
trabalho, principalmente nas fábricas da república velha.


O anarco-feminismo, por ser mais uma vertente do anarquismo, almeja a

construção de uma sociedade não autoritária, baseada na cooperação, no cuidado,

no apoio mútuo e no amor livre. Ou seja, almeja o que muitas feministas chamam de

“feminização” da sociedade, o que, para as anarco-feministas, não pode ser

alcançado na sociedade capitalista, onde há igualdade somente do ponto de vista

formal (liberalismo). Nesse sentido, o feminismo não pode estar separado da “luta de

classes” e da idéia de luta pela construção de uma sociedade anárquica, onde

igualdade e liberdade, assim como a vida comum entre todos os indivíduos, estariam

presentes não só no discurso.

É apenas ambição dar para uma mulher de uma determinada classe a

oportunidade de uma participação mais integral em um sistema de

privilégios e se estas instituições (as instituições capitalistas) são injustas

quando os homens tomam partido delas, elas também serão injustas

quando as mulheres tomarem partido delas. (Frederica Montseny, apud:

www.google.com.br).

[...] O ideal de “iguais oportunidades” dentro do sistema capitalista levarão

as mulheres livres a ignorar o fato de que qualquer sistema onde houver

mulheres da classe trabalhadora sendo oprimidas por chefes (sejam eles

machos ou fêmeas) é nocivo. (www.google.com.br).

Consequentemente ele é também uma crítica ao feminismo liberal e sua luta
pela inserção da mulher na sociedade capitalista (luta essa que até hoje observamos
em algumas feministas ao lutarem pela inserção da mulher no mercado de trabalho),
além obviamente de ser uma crítica ao capitalismo e sua ideologia liberal.

Na sociedade moderna (a que tem início com a ascensão da burguesia
enquanto classe dominante) há a idéia de que a mulher é o núcleo e pilar dessa
sociedade. Afirma-se que o patriarcado caracterizou épocas anteriores na história.
Porém, essa idéia de mulher como núcleo faz com que sejam criados uma série de
valores, modelos e formas de conduta sobre ela que são impostos e subjetivados
por todas as classes sociais (“controle dos corpos”, citando Foucault). Esses valores,
modelos e formas de conduta fazem parte de uma moral social, no caso a moral
burguesa, capitalista. E é aqui que está a maior crítica das anarco-feministas: elas
propõem uma moral libertária oposta à moral burguesa, que oprime a mulher em
todos os sentidos e incidem de maneira extremante perversa sobre a mulher
trabalhadora (tanto no sexo quanto no trabalho, basta ver que a mulher recebe
menos em um trabalho fabril por serem supostamente inferiores, o que faz com que

o salário de toda a classe trabalhadora seja pressionado para baixo).

Para as anarco-feministas, assim como para todos os anarquistas, a mulher é

responsável por sua libertação, opondo-se, assim, a qualquer forma de organização

burocrática e autoritária que se digam revolucionárias.

Seu desenvolvimento, sua liberdade, sua independência, precisa vir de si

própria. Primeiro, pelo reconhecimento de si própria como uma

personalidade, e não como um objeto sexual. Segundo, pela recusa do

direito de alguém sobre o seu corpo; pela recusa em gerar crianças a

menos que queira, pela recusa em ser uma serva de Deus, do Estado, da

sociedade, do marido, da família, etc., por tornar sua vida simples, mas

profunda e rica. Em suma, pela tentativa de aprender os princípios e a

substância da vida em todas suas complexidades; pela libertação pessoal

do medo da opinião e da condenação pública. (Emma Goldman, apud:

www.google.com.br).

No Brasil, e mais especificamente em São Paulo no período conhecido como
Primeira República (1889-1930) foram criados inúmeros símbolos - que na mais
eram, senão parte dos ideais modernizadores da época - que tinham como
finalidade principal formar um modelo único de mulher, a “esposa-mãe-dona-decasa”
assexuada e só dedicação aos filhos, ao marido e ao lar. Não há como deixar
de colocar que esses símbolos já apresentados e o modelo ideal de mulher foram
elaborados pela burguesia nascente da Primeira República, período de intensas
transformações em todos os sentidos (políticos, econômicos, sociais, culturais e
morais), com apoio das bases teóricas do Positivismo (corpo teórico burguês e
considerado revolucionário depois da Revolução Francesa), da moral católica e da
ciência, que afirmavam, cada um a sua maneira (como será observado nessa
pesquisa), a suposta inferioridade natural da mulher.

O modelo ideal de mulher, que ganha força no referido período, está ligado à
idéia burguesa de que a moral é essencial para a manutenção da ordem e da
sociedade. Nesse sentido, estaria a mulher no centro: ela é o pilar da sociedade
burguesa e capitalista, já que é responsável por transmitir aos filhos os valores
sociais através da educação no lar e, por conseqüência, manter uma das maiores,
senão a maior, das instituições da sociedade burguesa: a família.

Os anarquistas em São Paulo, por sua vez, promovem uma crítica à moral
burguesa e às suas instituições, além obviamente, da crítica à política, à economia e
à cultura na sociedade capitalista. A concepção de revolução no anarquismo envolve
também a transformação total da sociedade, ou seja, a transformação das relações
pessoais, sociais e cotidianas. Nesse sentido, as mulheres anarquistas em sua
atuação em São Paulo vão mais longe do que muitos dos grandes teóricos do


anarquismo do sexo masculino: propõem bases teóricas do anarquismo como meio
para emancipação da mulher, que não existe sem a emancipação da humanidade;
propõem a educação sexual e libertária; o amor livre; a maternidade livre e
consciente; a livre união; criticam o casamento monogâmico e contratual burguês,
discutindo também as relações hierárquicas existentes também no movimento
anarquista, principalmente no que se refere às hierarquias com relação aos sexos,
apontando e criticando o machismo nos meios operários. São mulheres como Maria
Lacerda de Moura, Isabel Cerruti, Isa Ruti,Tecla Fabri, Teresa Carl, Maria Lopes,
além de muitas outras que a História, como disciplina machista e sexista, tentou
apagar, mas que estudos recentes têm tentado buscar.

Nesse sentido, a questão da emancipação das mulheres pela sua libertação
econômica e cultural foi reforçada no amplo debate que os anarquistas
travaram, ao criticar as instituições burguesas e patriarcais. A luta pela
independência feminina era, nesse registro, primeiramente uma questão
moral: trata-se de libertar-se do modelo burguês de feminilidade imposto e
de construir uma nova figura de mulher. (RAGO, 1997, p. 77 e 78).

A moral libertária fundamenta-se na oposição à moral burguesa e se coloca
como meio para a transformação social e como moral da sociedade futura e ideal. O
papel das mulheres libertárias dentro dessa crítica à moral burguesa - assim como
suas atuações nos movimentos políticos como as greves, a resistência cotidiana, os
movimentos culturais, como por exemplo o teatro libertário e as escolas modernas –
foi imenso.

Uma das mais importantes questões colocadas pela moral libertária foi o amor
livre e a crítica ao casamento monogâmico (contratual burguês).
O amor livre não significa a apropriação comum da mulher, mas quer dizer:
a liberdade ilimitada para a mulher, como para o homem, de amar quem
quiser, a liberdade de concentrar sobre uma pessoa, antes que sobre outra,
todos os afetos. (Oreste Ristori, “A Terra Livre”, 2 de abril de 1907).

Porém as mulheres anarquistas colocam em seus discursos - analisados
através dos jornais anarquistas “A Terra Livre”, “A Plebe” e “Revolução Social” e da
revista “Renascença” (fontes utilizadas nesse trabalho) – inúmeras questões, o que
demonstra também, como as vertentes do anarquismo se entrecruzam (no caso é
nítida a articulação entre anarco-feminismo, anarco-sindicalismo, anarco-pacifismo e
arte, educação e anarquismo) e quão rico foi o movimento anarquista em São Paulo
no referido período.

Aqui temos vivido a civilização uni–sexual, a mulher não passou de
espectador no cenário da vida. (Maria Lacerda de Moura, apud: LEITE,
1984, p.10).


A História, como disciplina machista, sexista e autoritária que é, suprimiu de

seu estudo determinados indivíduos. Isso é muito nítido quando tentamos estudar as

mulheres libertárias. Porém ao observar “A Plebe” (de 1917 a 1930) vemos uma

infinidade de artigos assinados por mulheres, mas nada sabemos sobre suas vidas

para além da militância observada no jornal. Um nome bem freqüente é o de Isa

Ruti. Ela tem artigos onde é expresso o seu anticlericalismo, como o que critica Dom

João Nery, clérigo de Campinas:

É verdade, o momento é de preocupações e reclama seriedade. Mas quem
poderá resistir ao riso espontâneo que nos irrompe dos lábios ao lermos as
parvoíces que a um jornalista do Rio disse S. Revma. O bispo de
Campinas?
O papa-hóstias, além de dizer tamanhas tolices, fez mal em se ocupar dos
operários, para não se ver, agora na berlinda, arriscando-se a ser um dos
primeiros alvos das cruzadas que se organizam para semear a terra de tudo

o que for obstáculo à existência de obras boas. (Isa Ruti, “A Plebe”, 25 de
agosto de 1917, ano I).
Em outro artigo também assinado por essa libertária, há uma forte crítica a

Rui Barbosa, o artigo intitula-se “Atenção Plebeus!”:

Rui Barbosa começa acariciar os trabalhadores!
O Estado publicou o colossal discurso em que sua excelência se refere,
num tom plangente, aos operários, como a pedir misericórdia.
[...]
Valia-se ele, com ufania de que serviu nos mais avançados postos em prol
da escravidão negra. Mas isso pouco importa à escravidão branca hodierna!
“Águas passadas não movem moinhos”.
(Isa Ruti, “A Plebe”, 10 de janeiro de 1919).


Assim como Maria Lacerda ( que será apresentada mais adiante), Isa Ruti

lutou contra o fascismo e sua influência no Brasil. Levantou-se contra a idéia da

construção de uma estátua em homenagem a Mussolini numa praça pública.

Ora, o povo... o povo para que há de protestar por isso? (Este povo paga
dois mil réis o kilo do feijão bichado, só porque protestar... não paga a pixa

– como diria o bom filósofo Jeca).
A idéia dos fascistas brasileiros de homenagear Mussolini elevando-lhe uma
estátua é cômico-ridícula e seria mais para a gente se apegar a rir do
disparate, se não fosse o pensamento que faz assomar aos nossos olhos
lágrimas de dor sobre a morte de nossos companheiros, inimigos da causa
sangrenta de Mussolini.
Mussolini, sobre ser feroz, é vaidoso, sobretudo vaidoso como muito
naturalmente são os grandes homens.
A sua fereza, as suas bravatas, a sua valentia, na terra que foi berço de
Garibaldi (mas que também gerou Nero em tempos idos), tem por principal
estímulo a vaidade. (Isa Ruti, “A Plebe”, 17 de maio de 1924, ano IV).
Jornais como “O Amigo do Povo” (também anarquista) trazem artigos de

outras libertárias, como é o caso das operárias Matilde Magrassi, Maria de Oliveira,

Tibi, Josefina Stefani Bertachi, Maria S. Soares, entre outras. Na maioria desses


artigos a instrução é colocada como importante arma para a libertação da mulher, o
que não difere das libertárias já apresentadas. Matilde Magrassi, por exemplo,
colocava que a luta das mulheres operárias não deveria ficar restrita às fábricas, à
reivindicação de melhores condições de trabalho e melhores salários. Deveria ser
uma luta contra a sociedade de classes, contra a exploração do capital e contra o
Estado. E, nesse sentido, a educação da mulher trabalhadora, seria instrumento de
luta importantíssimo. Essa educação proporcionaria à operária a desmistificação dos
modelos de mulher.

Compreendereis que é inteiramente inútil que confieis aos padres as nossas
dores. Aconselhando-vos a resignação, o que ele faz é impedir-vos de
reagir contra quem vos oprime. (Matilde Magrassi, “o Amigo do Povo”, 17 de
janeiro de 1904, apud: RAGO, 1985, p. 96 e 97).

Propunha ainda que as mulheres operárias se unissem:

É já tempo que a mulher operária faça também nesta cidade o que vai
fazendo em tantas outras cidades civilizadas (...). Uni-vos, formai
sociedades de resistência, procurai conquistar bem-estar, despertai do
longo letargo no qual tendes estado adormecida até hoje. (Matilde Magrassi,
“O Amigo do Povo”, 27 de junho de 1903, apud: RAGO, 2000, p. 595).

Maria de Oliveira, por outro lado, afirmava que a luta pela libertação feminina
deveria unir a mulher operária e a mulher burguesa, que também é oprimida. Já
Josefina Stefani Bertachi negava a figura de mulher da “Rainha do lar” e “anjo
tutelar”, na mesma medida em que coloca um outro modelo oposto a esse. Isso fica
bem claro em seu artigo em “A Terra Livre”:

Entre a feminista ultra, forma híbrida, sexual e a massaia no sentido romano
da palavra: stetti em casa e filo lana, existe justo meio: a verdadeira mulher.
A mulher, nem patroa, nem escrava, nem femina, nem angélica, nem
asséptica, nem messalina, mas amante e amada. (Josefina Stefani Bertachi,
“a Terra Livre”, 15 de junho de 1906, apud: RAGO, 1985, p. 103).

Tibi questiona o matrimônio como contrato puramente composto de interesses

econômicos. Oposto ao amor:

O matrimônio apenas serve para abreviar a duração do amor, tornar odiosa
a união. No lar, a mulher é escrava, o homem é o senhor, este tem o direito
de mandar, aquela o direito de...obedecer (...).
Como pode existir o amor entre uma escrava e um senhor? (...).
Por isso se diz: o casamento é a morte do amor. (Tibi, “O Amigo do Povo”, 2
de agosto de 1902).


Ainda cabe colocar aqui outras três libertárias que escreveram um manifesto
para organização do sindicato das costureiras das confecções. São elas: Teresa
Carl, Tecla Fabbri e Maria Lopes, ambas operárias.

Devemos demonstrar, enfim, que somos capazes de exigir o que nos
pertence, e se todas forem solidárias, se todas nos acompanharem nessa


luta, se nos derem ouvidos, nós começaremos por desmascarar a cupidez
dos patrões sanguinolentos. (...)
Não devemos, porém, esperar que nos concedam o que nos pertence
quando lhes agrade. Devemos toma-lo por nossas mãos (...) temos o dever
e o direito de o fazer. Não deixemos, sobretudo, adular com falsas
concessões e promessas por parte de nossos sanguessugas. (Teresa Carl,
Tecla Fabbri e Maria Lopes, “A Terra Livre”, 16 de julho de 1906 e 15 de
agosto de 1906).

Além dessas anarquistas podemos citar os nomes de Angelina Soares, que
colaborava nos jornais anarquistas “La Barricata” e “Germinal” e promovia discursos
em manifestações ou nos festivais operários. Elvira Boni, operária nascida em
Espírito Santo do Pinhal (interior de São Paulo) e que teve importante atuação no
movimento anarco-sindicalista, principalmente no Rio de Janeiro. Ou ainda Laura
Brandão, que participava como oradora em comícios em São Paulo.

As atuações das libertárias nas greves, nas “agitações públicas” e a sua
organização em agremiações e federações na Primeira República foram inúmeras,
como fica claro nos jornais operários e no trabalho de Paula Beiguelman (1977),
onde é possível notarmos uma infinidade de movimentos grevistas iniciados por
mulheres. Por exemplo: em 1901, na manhã de 16 de fevereiro, entravam em greve
cerca de 600 operárias da fábrica de tecidos Sant’Anna (no Brás), de propriedade de
Antonio Álvares Penteado; protestavam contra medidas que implicavam o
rebaixamento do salário mediano. As operárias faziam piquetes todas as manhãs.
Com a intervenção da polícia ocorreram prisões como a da tecelã Giuseppina
Cutolo. Já em 1902 as operárias da fábrica de tecidos Anhaia (Bom Retiro) declaram
greve contra os maus tratos do mestre de teares. Aqui aparece o nome de uma
jovem de 17 anos que fora expulsa da fábrica por esse mestre: Emma Satorelli. A
greve só acaba quando tal mestre é despedido.

Como recomeçassem as insolências dos contra-mestres e o capricho do
patrão, de novo as operárias da fábrica de tecidos Anhaia do Bom Retiro, se
viram obrigadas a declarar greve. (...)
Em meio à forte simpatia do povo trabalhador. Pode-se dizer que o
movimento operário em São Paulo começa a valer, com esta greve, que é
uma das mais importantes que se tem feito no Brasil. (“O Amigo do Povo”,
22 de novembro de 1902, apud: BEIGUELMAN, 1977, p. 28).

O ano de 1907 é marcado pela eclosão da greve das costureiras no estado de

São Paulo:

Uma das mais ignominiosamente exploradas, a classe das costureiras de
carregação, na sua quase totalidade de mulheres, agitam-se atualmente em
São Paulo para arrancar um aumento de salário de seus patrões. Estes,
quase todos de nacionalidade estrangeira, sórdidos e exploradores em
máximo grau, negaram-se a satisfazer o pedido das operárias que


declararam-se em greve imediatamente. (“A Terra Livre”, 26 de novembro
de 1907, apud: RAGO, 1985, p.72).

Possivelmente o ano mais importante, em termos de agitações grevistas e de

efervescência de formação de federações e de manifestações públicas, para o

movimento operário tenha sido o ano de 1917, ano da Greve Geral, que começa

com as operárias do Cotonifício Crespi, na Mooca. Essa greve expande-se para o

estado inteiro. Formam-se inúmeras agremiações, federações, centros de

convivência e discussão, onde a presença feminina é marcante e explicitada na

imprensa operária e na imprensa burguesa. No caso da segunda há um exemplo

claro:

Um bando de mocinhas, infelizes operárias de fábrica, tomou conta de três
bondes. Às onze e meia, a light mandou suspender o tráfego de bondes e
duas horas depois não havia nenhum veículo de espécie alguma em
movimento. (“O Estado de São Paulo”, 13 de julho de 1917, apud:
BEIGUELMAN, 1977, p.86).

“A Plebe”, durante todo o ano de 1917, noticiou a formação de ligas operárias,

dando ênfase à participação feminina:

Vai num crescendo animado a atividade em todos estes centros de
propaganda e ação proletária.
Na liga do Cambuci teve lugar, segunda-feira, uma animada assembléia, em
que o elemento feminino se mostrou muito entusiasmado. (“A Plebe”, 15 de
setembro de 1917, ano I – suplemento).
As ligas operárias trabalham: multiplicam-se as reuniões, nas quais participa

o elemento feminino. (“A Plebe”, 18 de agosto de 1917, ano I).
No ano de 1919 as greves continuavam, e “A Plebe” anunciava a formação

da “União das Costureiras”:

Eis uma notícia animadora e que atinge em cheio a consciência de muitos
operários: as costureiras desta capital acabam de se constituir em
associação de classe, reconhecendo assim que só com a união, a
solidariedade, a ajuda mútua é exeqüível a reivindicação de direitos
postergados.
[...]
As costureiras conscientes da sua dignidade e do seu valor, decidiram-se a
ser mulheres, na verdadeira concepção do termo e não manequins
moldados pela boutique dos seus algozes de ambos os sexos. Ergueram a
fronte com altivez e à exploração disseram que já não eram escravas
passivas e submissas [...]. (“A Plebe”, 19 de abril de 1919, ano II).

O ano de 1920, por sua vez, é marcado pela fundação do “Centro Feminino

de Jovens Idealistas”, que tem como principal campanha nesse ano, a “campanha

em prol dos camaradas deportados”, em que pediam ajuda, inclusive financeira, de

todos os trabalhadores.

Continuando a campanha em prol dos camaradas deportados que ainda
permanecem privados da liberdade em Portugal e na Espanha, este centro


convida os trabalhadores e o povo em geral para assistirem a grande
reunião que se realizará na próxima segunda-feira, 30 do corrente, às 8
horas da noite.
Farão uso da palavra para expor as condições em que se acham os
companheiros deportados, diversos militantes do movimento operário de
São Paulo.
Que ninguém falte. Tudo pela liberdade dos nossos companheiros. (Pelo
Centro – A Secretaria, “A Plebe”, 4 de setembro de 1920, ano IV).

Em 1922 o mesmo jornal traz o anúncio da fundação da “Federação

Internacional Feminina”:

Fundou-se nesta capital uma organização que tende a organizar todas as
presenças femininas dispersas [...]. (“A Plebe”, 1° de maio de 1922, ano V).

E o anúncio de inauguração do “Centro Feminino de Educação”:

A emancipação da mulher não está na igualdade desta perante o homem,
nas prerrogativas políticas, de mando e de trabalho, mas sim na
emancipação da Humanidade da tutela política e na igualdade econômica e
social de todo gênero humano.
A mulher não é escrava do homem (salvo em casos anormais), mas sim
escrava juntamente com o homem de mil preconceitos, e vítima, como ele,
da exploração exercida pelos potentados de ambos os sexos, tanto sobre o
homem como sobre a mulher.
Iguala-la aos homens é ficar onde estamos. Nós devemos é lutar ao seu
lado e junto aos homens para que a emancipação da mulher seja um fato,
não para a mulher, ou para o homem, mas para todas as pessoas (inclusive
crianças e adolescentes) para a Humanidade, porque os dois sexos se
integram e se completam. (Isabel Cerruti, “Discurso de inauguração”, apud:
CORREA, 1986, p. 65).


Maria Lacerda de Moura mudou-se para São Paulo em 1921, nessa cidade

ela, que já via a educação como um meio regenerador da sociedade, passa a

amadurecer essa idéia de ação e também em relação a outras questões, como a

emancipação feminina, o anticlericalismo, a luta contra o fascismo, a luta contra a

guerra; nessas bandeiras de luta se aproximava dos trabalhadores e do anarquismo,

apesar de nunca ter se denominado anarquista, assim como Tolstoi, sua maior

influência, mas seguia a opção da suprema resistência e da não-violência, bem aos

“moldes” de Gandhi. Denominava-se apenas individualista. Sempre questionou a

distribuição de papéis dentro da família, onde a mulher deveria obedecer

primeiramente ao pai e ao irmão, depois ao marido, devendo cumprir tarefas

domésticas e nunca reclamar. Para ela, a Igreja tinha papel fundamental na fixação

de um modelo de mulher inferior e obediente. Justamente por isso, assume uma

posição anticlerical, que defendeu por toda a sua vida, nas suas obras, em suas

conferências e nos seus artigos na imprensa operária.

A mulher patrícia não pode penetrar os arcanos da questão, na sua maioria
escrava da religião, dos trapos, das jóias, dos bombons e do salário – não


pode pensar senão pela cartilha dos dogmas, das modistas, das vitrines e
da luta pelo estômago.
A religião, em constante conflito com a ciência tem na mulher a alavanca
reacionária contra a evolução para os feitos mais altos [...]. (Maria Lacerda
de Moura, 15 de junho de 1922, apud: LEITE, 1984, p. 20).

Segundo Maria Lacerda, a única solução para a mulher conseguir se

emancipar do cativeiro que se encontra é a emancipação intelectual, que poderá ser

alcançada através da educação.

Cumpre desembaraça-la das peias que a encarceram mentalmente.
Enquanto não souber pensar será instrumento passivo em favor das
instituições do passado. E ela própria, inconseqüente, trabalha pela sua
escravidão.
E o cativeiro é tal que se revolta se outras mulheres querem elevá-la à
altura dos seus direitos clamando contra a violação do pensamento
feminino.
Enquanto não pensar, em vão tentaremos quebrar os grilhões para a nossa
independência individual; a mulher é escrava; dependente do salário, do
homem, do seu capital.
Assim é impossível a libertação.
Seu cérebro foi considerado infantil pelo egoísmo masculino dos ancestrais.
[...]
A brasileira ardente, altiva, inteligente, idealista, generosa, num impulso
final, por entre relâmpagos da consciência adormecida, perceberá.
[...]
Faltam-nos escolas.
Faltam-nos educadores na acepção mais ampla da expressão.
Faze-los nascer deste mesmo povo – eis o que é preciso. (Maria Lacerda
de Moura, 15 de junho de 1922, apud: LEITE, 1984, p.20).


O ano de 1921 também foi marcado para essa feminista como o ano da sua

completa ruptura com o feminismo liberal ou sufragista, liderado por Bertha Lutz.

Antes desse ano ela reivindicava o direito ao voto feminino como meio para

emancipação da mulher, assim como, meio para a regeneração moral da política,

chegando até a estar junto de Bertha na fundação da “Liga pela Emancipação

Intelectual da Mulher”, no ano de 1918. Em relação a tal ruptura é possível

entendermos que a sua vinda para São Paulo lhe forneceu elementos básicos (ao

ter contato principalmente com os anarquistas) para o seu descrédito com o sistema

eleitoral. Ainda no ano de 1921, Maria Lacerda havia fundado a “Federação

Internacional Feminina”, mas já no ano de 1922 exonera-se da presidência dessa

associação afirmando que só reunia mulheres da classe média com o intuito único

de praticar filantropia. É a sua completa ruptura com o feminismo sufragista de

Bertha Lutz. Depois dessa ruptura, em 1924, publica um de seus mais importantes

livros: “A mulher é uma degenerada?”, onde faz uma crítica à ciência e aos médicos

desse período da história, que afirmavam supostas características naturais das


mulheres que seriam responsáveis por uma, também suposta, comprovação de uma
inferioridade inata da mulher. Teorias científicas essas que colocavam as prostitutas
como naturalmente degeneradas; sendo a “comprovação” de absurda teoria o fato
de possuírem os quadris largos. Maria Lacerda retomava nessa obra também a
importância do esclarecimento, ou seja, da emancipação intelectual da mulher.

Fica cada vez mais evidente a sua aproximação do anarquismo. Em 1926
publica “Religião do amor e da beleza”, onde é nítido seu anticlericalismo, ao colocar
a Igreja como responsável por cristalizar o modelo de mulher submissa e inferior, e
ainda, inspirada pelo anarquista Han Ryner, coloca o amor livre, como espontâneo e
natural. Para ela, o amor é a principal força que guia e motiva todos os seres
humanos e, justamente por isso, só pode ser livre.Essa aproximação torna-se clara
a partir do momento em que passa a perceber que não é possível a emancipação
feminina sem a emancipação humana da sociedade burguesa e capitalista, que cria
modelos de mulher respaldados pela ciência e pela Igreja.

A singularidade de Maria Lacerda de Moura provém da articulação que
estabeleceu entre o problema da emancipação feminina e a luta pela
emancipação do indivíduo no capitalismo industrial, cujo recrudescimento
ela apontou nos regimes fascistas que então se estruturaram. (LEITE, 1984,

p. 28).
Na década de 20 do século XX, Maria Lacerda organiza a Biblioteca Social “A

Inovadora”, que funcionava como um centro de leituras e agrupamento cultural

anarquista. São inúmeros seus artigos publicados em “A Plebe”. O mesmo jornal

também publica muitos artigos de outros anarquistas, nos quais são comentados os

livros e as conferências de Maria Lacerda (já que nessa década dava muita dessas

conferências no meio operário). Nessa fase, nos anos de 1919 a 1924, são nítidas

as suas tendências anarco-feministas.

Não há emancipação feminina sem emancipação humana. Nesta
organização social burguesa-capitalista, baseada na exploração do homem
pelo homem, todos são escravos, todos são explorados pelo industrialismo,
absorvente, pelas necessidades desnecessárias, criadas pela cupidez do
capitalismo.
Para o homem se emancipar do regime de patrões e exploradores e para a
mulher se emancipar do mesmo regime e emancipar-se da proteção
masculina seria preciso que a atual organização social de privilégios e
preconceitos desaparecesse pela substituição da ordem de outra sociedade
mais eqüitativa. (Maria Lacerda de Moura, 1920 apud: LEITE, 1984, p.46).

Diferentemente de Maria Lacerda de Moura, Isabel Cerruti nasceu em uma
família de operários. Trabalhou como tecelã em São Paulo e sua militância no
movimento anarquista pode ser percebida através de seus artigos publicados na


imprensa operária, principalmente em “A Plebe” e nas suas atuações nas greves,

nas ligas operárias, nos comícios e manifestações. Nunca escreveu livros, também

ao contrário de Maria Lacerda. Tinha convicção profunda acerca do anarquismo.

Denominava-se anarquista. Criticou a religião, o capitalismo e o militarismo em

muitos de seus artigos, com por exemplo em “Fé, Esperança e Caridade”.

Oh! Santas virtudes – fé, esperança, caridade! – sem vós o que seria dos
filhos de Deus?!
O pobre encontra nelas lenitivo para as suas dores e misérias... o rico – o
mais ditoso – basta à caridade para galgar os píncaros da eterna mansão.
Naturalmente, assim será enquanto a classe produtora das imensas
riquezas que nos rodeiam se prestar a desempenhar o deprimente papel
que lhes destinaram – de mendiga e espoliada – na tragicomédia da
existência atual e cujos principais atores são: a religião, o capitalismo e o
militarismo [...]. (Isabel Cerruti, “A Plebe”, 25 de agosto de 1917, ano I).

Para os anarquistas a cultura é um meio para emancipação da Humanidade.
Cultura essa que deve ser uma forma de contestação também da cultura burguesa,
deve colocar-se em oposição à última. As suas manifestações artísticas conterão
uma crítica da sociedade atual. Tal explicação, embora muito geral, torna-nos
possível entender o porquê dos anarquistas da Primeira República darem tanta
ênfase na realização de festas e festivais públicos, na organização de escolas
modernas, de teatros sociais, de bibliotecas, de centros de cultura social e da
formação de grupos musicais de operários. No entanto, não é possível deixar de
dizer que as manifestações artísticas do operariado, além de contestação, eram
formas de convivência social avessas às que a burguesia desenvolvia na cidade,
levada por ideais de modernização e europeização. Dessa maneira é possível
observarmos a presença de muitas mulheres libertárias nas mais diversas práticas
culturais desenvolvidas em São Paulo.

Paula Soares, por exemplo, transformou sua casa, no Brás, desde 1914 até
mais ou menos 1923, em ponto de encontro de anarquistas, redação de jornais, sala
de alfabetização e estudos do anarquismo. No teatro operário em São Paulo
também houve muitas presenças femininas, entre as quais destacamos: Maria
Antonia Soares, Maria Angelina Soares, Olga Biasi, Maria Garcia, Carolina Boni,
Helena Santini, Lúcia Santini, Vitória Guerreiro, Matilde Cruz, Esmeralda Bários,
Nena Valverde, Cândida Alarcón, Mercedes Solí, Nieves Simon, Margarida Salles,
Adelina Santos, Odessa Paviela, Rosa Corti, Nilsa Molina, Nilsa Pires, Angelina
Valverde, Maria Valverde Dias, Itália Fausta, operária tecelã, que começou a atuar
nos filodramattici (grupos teatrais de italianos que tinham como objetivo angariar


fundos para ajudar imigrantes italianos a saírem das péssimas condições de
trabalho do campo e virem para a cidade) e acabou tornado-se atriz profissional.

O movimento anarco-feminista aqui apresentado influenciou profundamente
os movimentos feministas das décadas de 60 e 70 do século XX e o influenciam até
hoje. Sem dúvida alguma aqui se encontra a maior função do historiador: buscar
entender o presente através do passado como colocara Marc Bloch e a primeira
geração da Escola dos Annales.

O que o historiador deseja captar é exactamente um mudança. Mas, no
filme que observa, só está intacta a última película. Para reconstruir os
vestígios apagados das restantes é forçoso, primeiro, desbobinar apelícula
no sentido inverso das filmagens. (BLOCH, apud: DOIN et al., 1999).

Ou como coloca um dos grandes autores da escola de Frankfurt, Walter
Benjamim (1994), devemos pensar o “tempo de agora”, caracterizado por sua
“intensidade e sua brevidade”, sem pensá-lo como algo linear, cronológico,
homogêneo e vazio, como por muito tempo a historiografia positivista, e mesmo o
materialismo histórico, o fizeram. O historiador não pode e não deve buscar uma
imagem eterna do passado, nem tentar “resgatá-lo exatamente como ele foi”, o que
deve ser buscado pelo historiador é a experiência coletiva passada.

Benjamin nos coloca que um dos maiores problemas da sociedade capitalista
é ter transformado a experiência em algo solitário, cabe ao historiador buscar a
experiência comum, “uma memória e uma palavra comuns”, através de uma nova
forma de narratividade – espontânea (assim como a experiência coletiva) e que leve
em conta a subjetividade desse historiador; não existe História totalmente objetiva. A
História é o passado e o relato feito desse passado, portanto, o historiador deve
buscar a experiência coletiva através desses relatos, ou seja, a busca da memória
coletiva deve ser primeiro plano na narrativa histórica. É através da memória que o
passado se aproxima do presente, que ele se torna parte do presente.

O narrador retira da experiência o que ele conta: sua própria experiência ou
a relata aos outros. E incorpora as coisas narradas à experiência dos
ouvintes. (BENJAMIM, 1994, p. 201).

Portanto, de acordo com Benjamin:

[...] o método do historiador [...] deve à estética proustiana a mesma
preocupação de salvar o passado no presente graças à percepção de uma
semelhança que os transforma os dois: transforma o passado porque este
assume uma forma nova, que poderia ter desaparecido no esquecimento;
transforma o presente porque este se revela como sendo a realização
possível dessa promessa anterior, que poderia ter se perdido para sempre,
que ainda pode se perder se não a descobrirmos, inscritas nas linhas do
atual. (GAGNEBIN, apud: BENJAMIN, 1994).


Deve-se buscar a experiência e a memória coletivas daquelas mulheres que

atuaram em um período de tantas mudanças, memória e experiências essas que por

muitas vezes a história se nega a narrar, desde àquela história positivista, passando

pelo materialismo histórico, até as análises estruturalistas e pós-estruturalistas da

história, que negam a existência do sujeito na História, pensando haver somente

estruturas em que esses sujeitos estão imersos e sem possibilidade de ação.

O cronista que narra os acontecimentos, sem distinguir entre os grandes e
os pequenos, leva em conta a verdade de que nada do que um dia
aconteceu pode ser considerado perdido para a História. (BENJAMIN, 1994,

p. 223).
Referências Bibliográficas

BARROS, Mônica Siqueira Leite de. As mulheres trabalhadoras e o anarquismo
no Brasil. Campinas/ S.P., 1979. Originalmente apresentada como dissertação de
mestrado, Universidade de Campinas.

BEIGUELMAN, Paula . Os companheiros de São Paulo. São Paulo. Ed. Símbolo,
1977.

BENJAMIN, Walter. Obras escolhidas: magia e técnica, arte e política. Ensaios
sobre literatura e história da cultura. São Paulo. Ed. Brasiliense, 1994. Volume 1.
7° edição.

BERMAN, Marshall. Tudo que é sólido se desmancha no ar: a aventura da
modernidade. São Paulo. Ed. Schwarcz, 1987.

BLOCH, Marc. Apologia da História ou O ofício de Historiador. Rio de Janeiro.
Jorge Zahar editor, 2002.

BRESCIANI, Stella; NAXARA, Márcia (orgs.). Memória e (res)sentimento:
indagações sobre uma questão sensível. São Paulo. Ed. Unicamp, 2001.

CANO, Wilson. Raízes da concentração industrial em São Paulo. Campinas/ S.P.
Ed. Unicamp, 1998.

CORREIA, Francisco. Mulheres libertárias: um roteiro. In: PRADO, Antonio Arnoni
(org). Libertários no Brasil: memória, lutas, cultura. São Paulo. Ed. Brasiliense,
1986.

COSTA, Caio Túlio. O que é anarquismo? . São Paulo. Ed: brasiliense, 1998.
Coleção primeiros passos.

D’ INCAO, Maria Ângela. Mulher e família burguesa. In: DEL PRIORI, Mary (org) e
BASSANEZI, Carla (coord. de textos). História das mulheres no Brasil. São Paulo.
Ed. Contexto, 2000.


DOIN, José Evaldo; NETO, Humberto Perinelli; PAZIANI, Rodrigo Ribeiro e
PACANO, Fábio Augusto. A Belle Époque caipira: problematizações e
oportunidades interpretativas da modernidade e urbanização no Mundo do
Café (1852-1930) – a proposta do Cemumc. Revista Brasileira de História, volume
27, n°53).

FOUCAULT, Michel. História da sexualidade vol 1: a vontade de saber. São
Paulo. Ed Graal, 2006 a. 17ª edição.

GOLDMAN, Emma. Tráfico de mujeres y otros esnsayos sobre feminismo.
Barcelona. Editorial Anagrama, 1977.

______. Viviendo mi vida. Madrid, Espanha. Fundación de estudios libertários
Anselmo Lorenzo, 1996. Volume 1.

ISMÉRIO, Clarisse. Mulher: moral e o imaginário (1889 – 1930). Porto Alegre.
EDIPUCRS, 1995.

LEITE, Mirian L. Moreira. Maria Lacerda de Moura e o anarquismo. In: PRADO,
Antonio Arnoni (org.). Libertários no Brasil: memória, lutas, cultura. São Paulo.
Ed. Brasiliense, 1986.

_____. Outra face do feminismo: Maria Lacerda de Moura. São Paulo. Ed. Ática,
1984.

_____. Outra face do feminismo (São Paulo, 1919 – 1935). Campinas/ S.P.
Cadernos Ceru. Volume 1, número 19 – junho de 1984.

LIMA, Mariângela Alves de, VARGAS, Maria Thereza. Teatro operário em São
Paulo. In: PRADO, Antonio Arnoni (org.). Libertários no Brasil: memória, lutas,
cultura. São Paulo. Ed. Brasiliense, 1986.

PERROT, Michelle. Os excluídos da História: operários, mulheres e
prisioneiros. Rio de Janeiro. Ed. Paz e Terra, 1988.

RAGO, Margareth; ORLANDI, Luiz B. Lacerda; VEIGA-NETO, Alfredo. Imagens de
Foucault e Deleuze: ressonâncias nietzschianas. Rio de Janeiro. DP&A editora,
2005. 2ª edição.

RAGO, Margareth. A sexualidade feminina entre o desejo e a norma: moral
sexual e cultura literária feminina no Brasil, 1900 – 1932. Revista Brasileira de
História (ANPUH).São Paulo. Ed. Marco Zero. Volume 14, número 28, 1994.

____. Do cabaré ao lar: a utopia da cidade disciplinar (Brasil 1890 – 1930). Rio
de Janeiro. Ed. Paz e Terra, 1985.

____. Mulher, História e feminismo. Campinas/ S.P. Cadernos AEL, 1995/1996.

____. O anarquismo e a História. htpp www.coletivosabotagem.cjb.net. Consultado
em 19 de julho de 2006 às 20h17min.


____. Os prazeres da noite: prostituição e códigos da sexualidade feminina em
São Paulo (1890 – 1930). Rio de Janeiro. Ed. Paz e Terra, 1991.

____. Trabalho feminino e sexualidade. In: DEL PRIORI, Mary (org.) e BASSANEZI,
Carla (coord. de textos). História das mulheres no Brasil. São Paulo. Ed. Contexto,
2000.

____. A invenção do cotidiano na metrópole: sociabilidade e lazer em São Paulo,
1900 – 1950. In: PORTA, Paula (org.) . História da cidade de São Paulo: a cidade
na primeira metade do século XX (1890-1950). São Paulo. Ed. Paz e Terra, 2004,
volume 3.

_____. Entre a História e a liberdade: Luce Fabbri e o anarquismo
contemporâneo. São Paulo. Ed. Unesp, 2001.

____. A experiência feminina do anarquismo no Brasil. In:ARAUJO, Ângela M. C.
(org.). Trabalho, cultura e cidadania. São Paulo. Scritta, 1997.

RICHTER, Liane Peters. Emancipação feminina e moral libertária: Emma
Goldman e Maria Lacerda de Moura. Campinas/ S.P., 1998. Apresentada
originalmente como dissertação de mestrado. Universidade de Campinas.

SEVCENKO, Nicolau. Orfeu extático na metrópole. São Paulo, sociedade e
cultura nos fumentes anos vinte. São Paulo. Ed. Companhia das Letras, 1992.

WOODCOCK, George. História das idéias e movimentos anarquistas. Porto
Alegre. Ed. L & PM Pocket, 2002. Volume 1 – A idéia.

_______ . Os grandes escritos anarquistas. Porto Alegre. Ed. L&PMPocket, 1981.

O que é anarco-feminismo. www.google.com.br. Consultado no dia 05 de julho de
2007 às 14h.

Fontes:

MOURA, Maria Lacerda de. Oração, 1932. In: PRADO, Antonio Arnoni e
HARDMAN, Francisco Foot (org.). Contos anarquistas: antologia da prosa
libertária no Brasil (1901 – 1935). São Paulo. Ed. Brasiliense, 1985.

Revistas:

Revista Renascença. São Paulo, fevereiro, 1923. Ano 1, número 1.

Jornais:

A Plebe. São Paulo, 1917 – 1930.
Revolução Social. São Paulo, 1923.
A Terra Livre. São Paulo, 1905 – 1906.